segunda-feira, 13 de abril de 2015

Um silêncio que reverbera as palavras

Não lembro quando ouvi falar, pela primeira vez, de Eduardo Galeano. Faz tempo... O fato é que nutro por ele uma admiração e um respeito desmedidos, pela sua sabedoria, coragem e dedicação aos direitos humanos. Sim, pra mim, cada letra que escreve e palavra que profere estão prenhas de desejo por justiça, com um apuradíssimo olhar sobre a encantadora e, tantas vezes, vergonhosa América Latina.

No dia de hoje, 13 de abril de 2015, quando é anunciada sua morte, busco na obra Los Hijos de Los Días, de 2012 (Siglo Veitiuno Editores) sua anotação sobre um 13 abril, e a transcrevo aqui, como minha homenagem a quem tanto contribuiu para refletirmos sobre a importância da memória e dos excluídos.

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No supimos verte

En el año 2009, en el atrio del convento de Maní de Yucatán, cuarenta y dos frailes franciscanos cumplieron una ceremonia de desagravio a la cultura indígena:

- Pedimos perdón al pueblo maya, por no haber entendido su cosmovisión, su religión, por negar sus divinidades; por no haber respetado su cultura, por haberle impuesto durante muchos siglos una religión que no entendían, por haber satanizado sus prácticas religiosas y por haber dicho y escrito que eran obra del Demonio y que sus ídolos eran el mismo Santanás materializado.
Cuatro siglos y medio antes, en ese mismo lugar, otro fraile franciscano, Diego de Landa, había quemado los libros mayas, que guardaban ocho siglos de memoria colectiva.

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Vários presidentes latino-americanos tentaram explicar isso a Barack Obama na recente Cúpula das Américas, no Panamá. Aliás, a lição foi enfatizada por um indígena, Evo Morales, que reiterou ao yankee que ele não tinha que oferecer ajuda a Cuba, como disse a Raúl Castro, na ocasião. Obama tinha que ressarcir Cuba. Mas, como aqueles citados franciscanos, Obama também não soube ver; disse que não lhe importa o passado, o que lhe importa é o futuro. E assim demonstra que nada aprendeu até agora, quando assina um decreto afirmando ser a Venezuela um país ameaçador aos Estados Unidos da América. Como disse Raúl Castro, Venezuela vive agora quase o mesmo que viveu Cuba, pelas mãos do mesmo algoz. Sobre isto, aliás, pretendia escrever. Adio para expressar meu pesar.

Posso dizer que sou afortunada por poder acompanhar Galeano tanto por seus livros quanto pelos programas que produz e exibe no canal argentino Encuentro. Num deles, da semana passada, disse que, desde criança, gostava de livros com imagens. E que, quando não há imagens, gosta de pequenos espaços em branco, como se fossem um silêncio. Um silêncio que reverbera as palavras.

2 comentários:

Geraldo Roger Normando Jr disse...

Erica, eu tinha certeza absoluta que você iria se pronunciar diante da morte de Galeano, um apaixonado por letras e futebol (Portanto, fez ele vários gols de letra). Não há como se estudar a America Latina sem passar pela literatura galeana. Temos a sensação clara de que esse uruguaio se enfurnou nas brenhas dessa América esfaqueada pelos colonizadores só para beber o sangue jorrado das veias de seu povo. Ele tinha um amor osmótico por esse tema: da poesia ao comentário ácido; do futebol ao convivio com Mujica, seu presidente que recebia conselhos dele. Você foi pontual.

Erika Morhy disse...

Ah, Roger! Verdade, foi inevitável. Eu precisava transbordar. Como disse o incrível Galeano: eu escrevo quando me pica a mão. Não escrevo por encomenda. Nem sempre é assim que passa comigo, mas desta vez foi, e você já domina um pouco sobre meus encantamentos e desapontamentos.
Pouco se fala sobre a atuação dele como jornalista, ainda que citem que ele o foi. Sei apenas de algumas revistas e jornais nos quais teve atuação fundamental e foi companheiro de trabalho de outras grandes figuras.
A imprensa é cruel e nós, muitas vezes nos deixamos conduzir por ela. Espero que a notícia reverbere por um pouco mais de tempo, tempo para sensibilizar mais gente a conhecer a obra e a importância do que dizia esse capo.
Um abraço grande, Roger.