quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

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CRACOLÂNDIA
Por Edyr Augusto Proença


Agora de tarde, o carro reportagem da RBA TV estacionou na Riachuelo, entre Presidente Vargas e Primeiro de Março. Nesta, estacionou uma viatura da PM, com dois soldados e um comandante. O comandante estava em uma ligação. É impressionante como falam ao celular. Vocês estão aqui para dar segurança ao carro da Tv? É uma reportagem sobre a Cracolândia? - Eles chegaram aos poucos, mas rápido formaram um time consistente. Jovens, pivetões, meia idade, homens e mulheres. Quase não dormem. Passam o dia à mercê de doses de crack. Não sei de onde vieram, expulsos. Adotaram a saída lateral do Cuíra, entrada e saída dos artistas, como seu ponto, meramente porque o recuo até a grade, é espaço suficiente para desviarem do vento e acender o cachimbo. Imagino que o incêndio há poucos dias em uma casa ali no Reduto, tenha como estopim os fósforos que acendem sem parar. A área do portão do Cuíra fica cheia de fósforos queimados. Tratam-nos muito bem, com respeito. Mas entre si, há disputas selvagens, com socos, facadas e tiros. Ficam amontoados feito percevejos, com suas roupas imundas, rostos macilentos. Pedem desculpas por não ter coragem de largar o vício. Disse-me isso um homem feito, seus 28 anos, talvez. Deslocaram de lugar as prostitutas da área, raras, com alguma idade e clientela de aposentados. Uma vez, tive o número e liguei para o Coronel Solano, tipo vice chefe da Polícia, algo assim. Queria pedir-lhe uma solução, um susto, que fosse, para que saíssem dali, por conta do prejuízo nos serviços do Cuíra, na área social e artística. Pra quê. Ouvi um sermão de vários minutos sobre ser um problema social, que estoura nas mãos da Polícia e  escambau. Assim o comandantezinho da patrulha que está lá no Cuíra agora, tarde de quarta feira, 30 de janeiro.
É uma reportagem sobre a Cracolândia? Que Cracolândia? Aqui não tem isso. Não tem? Tem sim, senhor comandante. São apenas umas cinco pessoas consumindo crack. Cinco pessoas? O senhor então não sabe. Trabalho aqui com o Teatro e posso lhe dizer que são uns cinquenta, talvez, tá bom, uns trinta, quem sabe. Olha aqui, esse é um problema social, entende? Nós estamos sempre passando por aqui. Passam e eles saem. Vocês dobram a esquina, eles retornam, vão até a Praça da República e voltam. Pronto, tocou novamente o celular. Ia dizer a ele que do meu prédio, podemos ver até o traficante agindo. Quando aparece a Polícia, certa vez, o guarda o conhecia. O traficante foi até lá, deu abraço e saiu na boa.
Leio que em SP, há discussão a respeito. Paulo Faria, que tem um teatro instalado no centro, região da Luz, é contra a tal internação compulsória. Drauzio Varela acha que precisa internar. Não tenho preparo para responder, mas, mais do que atrapalhar a paisagem, incomodar quem passa, até ameaçar os transeuntes, a sociedade precisa encontrar rápidamente uma saída para esses infelizes viciados.


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4 comentários:

Marise Rocha Morbach disse...

O escritor Edyr Augusto Proença, e sua companheira, a atriz Zê Charone, integram o Grupo de Tetro Cuíra. Este grupo tem um trabalho, na área teatral paraense, de longas datas, e de grande qualidade. O que Edyr Augusto Proença está narrando, são as dificuldades de desenvolver um projeto cultural em uma cidade que despreza seu patrimônio cultural e artístico; e, ao mesmo tempo, está narrando o que acontece neste momento no bairro da Campina.

Geraldo Roger Normando Jr disse...

A veia sangrando do Edyr, ao meu ver, pode ser tamponada pelas ideias médicas do Druzio Varela, que se expressa como um profisional diante de uma epidemia (Sim, o crack é doença e se apresenta como epidemia)somadas a uma atitude policial mais incisiva. Enquanto uns se alienam da verdade, os policiais, no caso, que acham que a sociopatia não lhe deve satisfação, outros enfrentam-na, mesmo sem saber se estão utilizando apenas um band-aid. As críticas a Drauzio são muitas, mas ainda não vejo outra solução que não seja a internação compulsória aos que ameaçam a si e a própria sociedade. É uma reação. Ao contrário do policial, uma negação.

Marise Rocha Morbach disse...

Roger, de tudo que estou observando, e na contramão de amigos e profissionais que são contra a internação, eu me coloco favorável. Penso que diante do que está ai e da ausência de atitudes, e de ações que quebrem o cotidiano da exposição nas ruas de casos como estes, sou favorável a internação, já que o crack isola o indivíduo de ações cotidianas e o vicia quase que instantaneamente. Ele acaba por conviver em grupos de viciados. Junto ao problema do crack, no caso de Belém, temos o abandono real da cidade nos últimos 12 anos. Ações foram feitas pontualmente em algumas áreas da cidade. Mas, somados ao abandono do patrimônio histórico - que se mantém com ações isoladas, como a do Fórum Landi - e nenhuma ação de preservação(que eu saiba), a cidade vai sendo ocupada como querem seus moradores. O crack é um problema nacional, mas que atinge pontualmente uma camada de seus habitantes quando se trata de espaço urbano. E isto tem transformado o problema da vida nas ruas, dos crakeiros, em um inferno para os moradores locais. É desesperador vê-los em atividade.... Aqui, estamos com confusões e brigas a cada duas horas(se fosse para cronometrar as ações). Bares e lugares para sentar neste entorno? Eu desconheço? O que vejo são casas sendo compradas, e algumas restauradas. Pessoas montando seus negócios e tentando sobreviver. Locais para guardar barracas e e os apetrechos da Feira da Pça da República; e o abandono geral do bairro pelo poder público. Inclusive, as putas, como bem colocou o Edyr, estão saindo; e temos os puteiros decadentes.A situação é desesperadora na dimensão que coloca o Edyr Augusto Proença, por um lado. Por outro, é desesperadora na dimensão do poder público que temos em Belém, e com o qual não podemos contar.

Unknown disse...

Pobres, sujos , fedidos , maltrapilhos , banguelas , berebentos , alucinados . Aí que nojo , aí que meeeeddoo !Eles nasceram assim?O que os fez assim?Quem os fez assim?O que eu fiz?O que fazemos nós ?O que faremos nós ?Só uma certeza ....