terça-feira, 22 de abril de 2008

O Microscópio*

O olho no microscópio
vê o outro lado, é solene
sondando o indefinível.

Dramática a paciência
do olho através da lente,
buscando o mundo da lâmina.

A tosse espera a sentença,
o leito aguarda a resposta.
O tísico pensa na morte.

O silêncio é puro e o frio
envolve o laboratório.
Os frascos tremem de susto.

O infinito dos germes
reflete o olho imenso
que pousa na objetiva.

O avental se levanta.
Os dedos inconscientes
escrevem a palavra rápida.

O resultado terrível
entra nos óculos do médico
e ele diz: positivo.

O doente tira o lenço.
Aperta a mulher e o filho,
chora no ombro da esposa.

Imagina a reclusão
no sanatório, a saudade
e o vento no quarto branco.

Olha o papel: positivo.
Cresce a palavra com a tosse.
A febre queima a esperança.

O microscopista, no entanto,
conta anedotas no bar.
Está alheio e feliz.

Não sabe que o olho esquerdo
ditou a sentença e a morte.
Paga o café e caminha.

*Bueno de Rivera - Mundo Submerso (1944).

Nenhum comentário: