sábado, 3 de junho de 2006

Tristeza e Saudades de Elisa Sá


Este blogger hoje vive momento de profunda tristeza pessoal. Acabo de tomar conhecimento do falecimento de Elisa Sá, Diretora do Hospital Barros Barreto, ocorrido por volta de 1 da manhã deste sábado, em São Paulo. A rapidez da evolução de sua doença contribui para dar um tom mais dramático e comover a todos que tiveram o privilégio de conviver com ela, mesmo que por relativamente curto período. O tempo para as despedidas, mesmo que subliminares, praticamente não houve. Foi como se um furacão se abatesse sobre todos.
Por força de nosso relacionamento administrativo no Hospital Barros Barretto, iniciamos um contato frequente e profícuo, que acabou por extrapolar os limites do meramente institucional. Ao visitá-la em seu gabinete, na maior parte das vezes levando-lhe uma montanha de problemas, costumávamos discutir as soluções entremeando assuntos absolutamente inusitados de caráter filosófico, político, humanista, ético, etc. Ao longo do tempo, acompanhando muitas vezes em silêncio suas ações administrativas, pude perceber sua imensa habilidade política, mesmo em meio às mais duras adversidades. Nestas horas, observava, ouvia e aprendia. Pouco falava. Ao final, dirigia-me sempre a ela de maneira privada e dizia: invejo a sua habilidade.
Com sua aparência de boa senhora, Elisa sabia como nunca utilizar seu talento para convencer e mobilizar.
Confesso que no início, não foi muito fácil estabelecer um relacionamento mesmo que administrativo com ela. Escaldado em minha vivência com políticos e administradores, cultivava a desconfiança e mantinha a necessária distância. Aos poucos, contudo, sua enorme e autêntica grandeza de espírito, de tom humanístico, longe de ser positivista, Elisa seduziu-me por completo. Baixei a guarda em questão de meses e passei a comparecer em seu gabinete, muitas vezes, para conversas informais agradabilíssimas. Mesmo na divergência, desenvolvemos uma relação madura, onde muitas vezes, alteramos a voz um com o outro. Mas isso nunca deixou qualquer rancor ou sinal de mágoa. No dia seguinte, lá estávamos nós atualizando as novidades do dia e aprofundando mais ainda nossas análises.
Com o enorme aprendizado que ela proporcionou e com a inestimável lição de tolerância, Elisa certamente irradiou seu perfume aos quatro cantos. Mesmo com a idade, que já lhe trazia seu preço, foi incansável na luta por verbas para o Barros Barreto. Enfrentou homens poderosos, intoxicados de testosterona (que era como eu os rotulava em nossas conversas), sempre com candura, inteligência e habilidade.
Muita dignidade. É como eu resumiria minha maior impressão de Elisa Sá nestes quase 5 anos de convívio. Foi pouco. Mereceria muito mais com ela.
E é com esta impressão final que a deixarei para sempre em minha memória.
Adeus, Elisa. Missão cumprida.

2 comentários:

Anônimo disse...

Conheci Elisa Sá nos meados da década de 80, à época da fase final da transformação da Santa Casa de Misericórdia do Pará em uma fundação estadual. Eram tempos duros para aquela instituição. Elisa, representando a UFPa, movia-se incansável por soluções e para atenuar conflitos inevitáveis entre as forças políticas que alí estavam representadas.
Mulher de opinião, sabia, contudo, contornar as arestas e armadilhas da vida administrativa e fazer garantir sua posição, mesmo quando não as tornava tão claras a princípio. Era interessante acompanhar seu desempenho numa mesa de negociação, quando conjugava ao mesmo tempo candura, objetividade e, não raras vezes, misteriosa teimosia.
Depois desse tempo de Santa Casa nossos contatos foram raros, mas sempre que nos encontrávamos a amizade se iluminava. A última vez em que nos demoramos numa conversa ótima foi à ocasião da visita que fizemos Eu e Esther ao Anselmo, que convalescia no antigo INCOR de um susto coronariano. Cada um puxou um lado da orelha do amigo, censurando-o quanto ao tabagismo.
Depois vim trabalhar em Brasília e vez por outra nos encontrávamos nos corredores e com alegria comentávamos nossos aborrecimentos com a saúde pública e a necessidade de "aturar" esse aborrecimento por muito tempo em nome do SUS, sistema que ela ajudou a construir com a geração de ouro de sanitaristas, entre os quais destaco o extraordinário Sérgio Arouca.
Fará falta sem dúvida. Como ser humano e servidora pública dedicada. Como companheira de luta por um SUS que atenda às necessidades da população brasileira, consolide-se como política de estado e mereça de nossos governantes federais, estaduais e municipais a atenção orçamentária que a realidade social brasileira exige.
Não farei votos de que descanse em paz, pois era feitio da Elisa estar sempre em movimento, arrumando ou construindo alguma coisa, sempre dinâmica. Avalio que, havendo o plano imaterial, continuará obreira nas grandes causas, como aqui o soube ser ao se tornar médica a vida inteira dedicada à saúde pública brasileira.
Itajaí

Unknown disse...

Uma bela e merecida homenagem a Elisa,Barretto.
Sou daqueles que a morte não alivia a biografia, mas no caso de Elisa sua ausência não pesa nos elogios,justíssimos.
É uma pena.